Quanto Tempo Vai Durar Meu Tratamento? — O Tempo na Psicanálise e a Esperança Cristã
- Fontes, Elias T.
- 16 de jun.
- 3 min de leitura
Por Carlos Henrique Muller Filho – Teólogo, Psicanalista e Conselheiro Pastoral
“Quanto tempo irá durar o tratamento?”
“Quanto tempo o senhor precisa para me libertar do meu sofrimento?”
Estas são, sem dúvida, duas das perguntas mais comuns que escuto no início de um processo de psicanálise. Elas são formuladas com dor, urgência e esperança. Quem pergunta quer, no fundo, saber se há saída, se há tempo para recomeçar, se a cura é possível. São perguntas humanas, legítimas, espiritualmente profundas — e psicanaliticamente desafiadoras.
A lógica do sofrimento não segue o tempo do relógio
A psicanálise, diferentemente das terapias com abordagens diretivas ou voltadas para resultados imediatos, se propõe a escutar o sujeito em sua singularidade. O sofrimento que chega ao consultório não é fruto de um único fator recente, mas está entrelaçado a experiências infantis, marcas intergeracionais, traumas silenciados e escolhas inconscientes repetidas ao longo da vida.
A pergunta sobre o tempo, então, não pode ser respondida com uma previsão matemática. Não há como dizer: “em seis meses você estará curado”, porque a psicanálise não trabalha com protocolos fechados, mas com o desvelar do inconsciente — e o inconsciente, como bem disse Freud, “não conhece o tempo”.
Cada sujeito é único — e cada percurso também
Há pessoas que, após poucas sessões, começam a experimentar alívios significativos, porque encontram um espaço legítimo de fala. Outras precisam de mais tempo para confiar, elaborar e tocar em dores profundas, muitas vezes dissociadas da consciência.
A repetição, os silêncios, os sonhos e os sintomas nos falam em outra linguagem — que exige escuta, paciência e constância. Isso pode levar meses ou anos, a depender da estrutura psíquica, da intensidade do sofrimento, da abertura do sujeito e das resistências que surgirem no caminho.
“Libertar-me do sofrimento” – um equívoco necessário?
Quando o paciente pergunta “quanto tempo o senhor precisa para me libertar do meu sofrimento?”, é fundamental esclarecer algo essencial: não é o psicanalista quem liberta. A função do analista não é a de um curador mágico, mas a de um acompanhante lúcido, ético e implicado com o processo de escuta. O sofrimento, por mais duro que seja, não é uma entidade externa que possa ser retirada por alguém de fora. Ele faz parte da constituição subjetiva do ser.
Em termos teológicos, poderíamos dizer que só Deus liberta no sentido mais pleno da palavra. Contudo, na escuta analítica, o sujeito se depara com suas escolhas inconscientes e passa a ter a chance de se responsabilizar por sua própria história, reescrevendo-a à luz de sua verdade interior.
Critérios para um bom processo psicanalítico
Desejo de escutar a si mesmo: Sem esse desejo, mesmo inconsciente, o tratamento não avança. O psicanalista não impõe, ele espera que o sujeito deseje falar.
Compromisso com o processo: O tempo é necessário, e isso envolve estar presente nas sessões com regularidade, inclusive quando não se tem muito a dizer.
Abertura para a verdade: A verdade, na psicanálise, não é uma informação, mas algo que se revela no discurso, nos lapsos, nos sonhos, nos silêncios.
Respeito pelo tempo do inconsciente: Cada avanço é fruto de elaborações internas. Pressionar o tempo é negar a profundidade do que precisa ser curado.
Integração com a espiritualidade: Para aqueles que têm fé, o caminho psicanalítico pode ser atravessado com orações, leituras bíblicas e reflexões cristãs que ampliem o sentido do sofrimento, integrando-o a uma jornada de transformação.
Uma escuta que acolhe, uma esperança que sustenta
Como teólogo e psicanalista, creio que há uma profunda conexão entre a escuta clínica e o cuidado pastoral. O tempo da psicanálise é o tempo da reconstrução do sujeito — um tempo sagrado, que não pode ser apressado. A pressa pertence ao mercado. A escuta pertence à alma.
Portanto, caro leitor, se você carrega essas perguntas dentro de si, saiba que o tempo da cura não é previsível, mas é possível. O sofrimento pode ser atravessado. A dor pode ser elaborada. E há esperança, porque o Espírito de Deus — aquele que nos consola e nos guia em toda a verdade — sopra onde quer, inclusive no silêncio de uma sessão.
Você não está só. Há caminho. Há escuta. E há tempo.

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